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sábado, 2 de julho de 2011

A plasticidade corporal e a dança contemporânea.



O ser humano é por natureza um ser plastico. Ele passa por experiências que o transformam. A cada transformação da pessoa, em razão de novas experiências, encontram-se novas formas expressivas. O corpo dançante remodela o mundo, da mesma maneira que o mundo o remodela. Quando a dançarina é obra de arte, ela representa o material de sua própria expressão. A fonte da expressividade do artista se encontra no mesmo contexto de seus atos  realizados no cotidiano. Nesta comunicação pretendo discutir sobre a relação plástica dos movimentos corporais do cotidiano e os apreciados sobre a cena e a noção dual do corpo. Trato a unidade corporal segundo Maine de Biran, a experiência estética segundo Dewey e a plasticidade segundo Demeulenaere. A pesquisa foi realizada em Brasília (Brasil), Montreal (Canadá) e Paris (França).



As pessoas de todas as culturas se reproduzem através do ato sexual e desaparecem com a morte. Durante sua existência, vivem numerosas experiências e mantêm contato com a exterioridade por meio do sensível, se não por meio da nutrição.
O humano aparece constantemente como um ser independente, no entanto ele demonstra uma dependência absoluta da estima de seus semelhantes e precisa viver em sociedade. Ele depende da relação face à face com sua exterioridade, necessita ser reconhecido no olhar do outro[1]. Seus hábitos refletem seus afetos trocados com o meio. Uso o termo afeto discutido por Maine de Biran[2]. Para ser afetado a pessoa tem que ter afeto pela coisa. É, portanto, um ato consciente de aceitação e não imposto.
O humano é plastico; modifica-se por meio de suas adaptações segundo as necessidades para a sobrevivência. Durante as guerras e calamidades naturais, é forçado a ultrapassar a si próprio para sobreviver; é capaz de se adaptar a uma alimentação rigorosamente controlada. Quando se encontra perdido por exemplo, numa floresta, aprende a se alimentar daquilo que a natureza lhe oferece; come aquilo que em situações normais lhe pareceria não degustável. Adapta-se ao espaço e ao clima. As pessoas que se tornaram cegas após uma determinada idade têm a mesma capacidade de desenvolver a sensibilidade auditiva como aqueles que nasceram cegos. As pessoas que nascem sem os braços, aprendem a se servir dos pés como se estes fossem suas mãos. Seguram garfos e facas, pintam seus lábios com batom, penteiam os cabelos, etc.
A pessoa troca o tempo todo com o meio em que vive. É uma maneira de se reconhecer e assim se sentir verdadeiramente inserida na cultura. São as relações de subjetividade/pessoa, experiência vivida, que marcam a nossa existência e edificam a nossa cultura. Segundo a etnologia, cultura é o conjunto de produções significantes de uma sociedade, o que implica em linguagem, tradições, maneira de viver, de se comportar, de se mover, entre outros.
Cada cultura estabelece uma relação do humano com o meio ambiente. Essa relação é apreendida durante o cotidiano da pessoa. Milton Santos[3] explica isso como patrimônio da cultura imaterial. Esse patrimônio pode ser uma fonte de informação muito importante para se entender as diferenças entre as culturas e suas criações artísticas. Cada cultura: brasileira, francesa, canadense, chinesa, africana, norte-americana, por exemplo, possuem cada qual um estilo próprio.
Os humanos são feitos da mesma matéria, indiferentemente da cultura a qual eles pertençam. Eles se assemelham, naquilo que diz respeito à estrutura anatômica/biomecânica, embora hajam particularidades nas tonalidades da cor da pele, dos olhos, dos cabelos e na estatura. Em todo caso, essas particularidades estão bem mescladas no território brasileiro. Se num mesmo pais, ainda que pequeno como a França, é possível perceber a diversidade tangível à expressão corporal, o que podemos dizer quando nos referimos à diferentes culturas?
Para os teóricos do gesto, os gestos comunicativos representam uma linguagem quase universal. Julia Kristeva[4] comenta que a linguagem não verbal é mais universal do que a verbal.  Isto quer dizer que uma expressão de tristeza ou de alegria  é reconhecida na maior parte dos países. Mas não vou me aprofundar na questão do gesto de comunicação pois meu interesse é a expressão artística em dança. 
As sociedades são muito diversas no mundo, e possuem sensibilidade e percepção  diferentes umas das outras. Não existe uma maneira de perceber as coisas, nem uma sensibilidade uniforme para todas as culturas. Um exemplo disso é a difusão de imagens de tortura dos soldados americanos, difundida na Internet pelos Iraquianos no período que os Estados Unidos invadiram o Iraque (2003). Para eles as imagens que mostram corpos sendo maltratados, significam imagens de terror. No entanto, no Ocidente, foi possível constatar a facilidade que as  pessoas têm para estetizar a punição do corpo, haja vista o sucesso que estes vídeos obtiveram em relação ao número de vezes que foram acessados na internet.
A experiência estética é compartilhada por todos que habitam um mesmo lugar. Os hábitos são aprendidos com aos pais, a família de um modo geral, e também com a comunidade. Assim, a aprendizagem estética se inicia na mais tenra idade e prossegue por meio de todas as experiências da vida cotidiana. Por exemplo, a aprendizagem estética da criança é estreitamente ligada ao desvelar do mundo. A criança sente o cheiro, escuta os barulhos, é sensível ao toque, ao calor e ao frio, assim como aos diversos sabores (amargo, doce, salgado, azedo, etc.) que formam os princípios corporais[5]. Ao mesmo tempo, ela conhece o mundo simbólico através dos sentidos que são de origem corporal (a paixão, o medo, os desejos, a animosidade)[6]. Tudo isso se mescla e se desenvolve para formar o que a criança está se tornando.
Assim, desde que nasce, a pessoa está em interação com o meio ambiente, ou seja, ela passa por experiências. As vezes estas passam desapercebidas, caso a pessoa não se dê conta de que ela é participante de uma experiência, pois que as ações não são realizadas com o intuito de experimentar algo preciso. Isto quer dizer que estamos o tempo todo passando por experiências sem que o objetivo seja a experiência, ela mesma. Assim, a pessoa não presta atenção em seus atos.
Quando aqui me refiro à experiência, estou falando daquilo que a pessoa vivencia diferente da experiência científica onde a pessoa não é o próprio objeto da experiência. Então falo aqui da experiência vivida.
Para falar verdadeiramente sobre o conhecimento de uma ação com propriedade, é preciso passar pela experiência. Eu não posso falar que conheço o gosto do caju se eu jamais saboreei  um caju. Mesmo que eu tenha aprofundado meus estudos sobre essa fruta, eu só posso me apropriar de seu sabor logo que eu realmente a deguste. Do contrário meu discurso sobre o caju, mesmo tendo um vasto conhecimento da fruta, não passará de um discurso teórico diferente do discurso dos que já o provaram. É importante ressaltar que tomar o suco de caju, não é o mesmo que comer a fruta. As experiências são particulares, preservadas e consideradas, sem que haja a preocupação com a sobreposição, assimilação ou destruição destas.
De fato, cada pessoa é o material de sua experiência. Mesmo que eu considere que um grupo viveu uma experiencia em comum, como partilhar as emoções de navegar em um barco em alto mar no momento em que começa uma tempestade, mesmo assim, cada pessoa terá reações diferentes, pois cada uma conta com suas experiências passadas. Nos fazemos a experiência da experiência. Falando mais precisamente, a pessoa participa das experiências dela mesma, e estas experiências tocam um espaço que não é comum à outras pessoas. Ninguém pode conhecer de fato as minhas sensações nas relações que estabeleço, pois elas não estão ao alcance dos outros. Somente eu tenho acesso à elas. Portanto a única pessoa a aceder suas experiências é ela mesma. Dessa forma, não tem como a pessoa transmitir ao outro, o gosto do caju provado. Ela pode tentar elaborar em palavras, o prazer ou o desprazer sentido ao saborear o caju, mas jamais a apreensão do sabor.

Cada pessoa tem diferentes sensações porque elas são mescladas à percepções individuais e únicas. Maine de Biran[7] comenta que a percepção é a reflexão sobre o  conhecimento que se apreende a partir do sensível, ou seja da experiência tátil, auditiva, gustativa, visual, olfativa e do equilíbrio. Essa apreensão é intencional e não passiva. Eu sinto o sabor agridoce do caju porque a minha sensibilidade se direciona à ele especificamente.
O corpo, matéria carnal e plástica, se modela segundo as experiências vividas e é  essa modelagem que dá aparência ao corpo, fazendo com que a pessoa se torne pessoa. Isto é o que Maine de Biran[8]  considera como Ego. É preciso apenas tempo para organizar esse vai e vem entre o momento ativo e passivo do efeito da experiência. O momento passivo é aquele que a pessoa é, ela mesma, o sujeito da experiência e o momento ativo, aquele que a experiência age sobre o sujeito. É bom reforçar que neste tipo de experiência, há trocas e fusões continuas que se afeiçoam à carne. Elas passam para o estagio de memória e cada vez que são solicitadas, reaparecem como lembranças.
Para que haja troca é necessário que a pessoa aprecie a coisa, se a relação é hostil, não existe troca[9], pois o sujeito se amalgama afim de concluir uma unidade. Como no amor, cada vez que duas pessoas estão enamoradas, existe uma espécie de fusão, sem que portanto, cada uma perca suas características, sua individualidade.
Em sua obra Aura, Stéphane Gladyszewski[10] ilustra bem esta fusão do corpo com as coisas com as quais o dançarino se relaciona. O artista cria efeitos de tromp l’œil. Aura provoca uma experiência óptica desestabilizante. Quando as imagens são projetadas sobre a pele ou sobre um tecido, e produz  efeitos  de tridimensionalidade e coloca o  espectador num estado de confusão e incapacidade de distinguir, no primeiro olhar, o que é virtual e o que é o dançarino, ele mesmo. No entanto, mesmo que as imagens deem a impressão de fusão, o que é virtual não se transmutará jamais em carne e o contrário também é verdadeiro.


Stéphane Gladyszewski, Aura, Montreal 2005, Foto: Stéphane Gladyszewski.


Desta maneira, a experiência provoca inicialmente um estado particular, onde um corpo se encontra amalgamado à uma outra coisa, seja ela um sabor, um cheiro, uma paisagem, um lugar. Depois a unidade se dissolve e cada parte retoma sua individualidade acrescentada do que foi vivido durante o tempo em que as partes se fundiram. Antes desta experiência, cada parte tinha suas características. Após, cada parte continua com suas características iniciais acrescidas dos afetos trocados com o “outro” no momento vivido durante a experiência. Isto implica em mudanças, as sensações serão, de agora em diante, enriquecidas pelos afetos trocados. O mesmo acontece com a percepção, a pessoa terá outra percepção das coisas.
A natureza da experiência é determinada pelas condições fundamentais da existência. O humano, como os animais, tem que se adaptar para sobreviver e para isso ele não se fecha no limite de sua pele, mas troca incessantemente com o meio ambiente. Essas trocas são íntimas, vão muito além do simples interagir.  A pessoa quando troca de lugar procede à uma fase de adaptação, esta não se faz mecanicamente, tem momentos que entram em atrito e em outros atuam em uníssono. Segue um ritmo e é por causa do atrito que vem o equilíbrio, e não por passividade. A ordem não é imposta pelo meio, mas numa combinação harmoniosa entre pessoa e espaço.
Dewey[11] comenta que a experiência estética requer um fim na experiência ela mesma, a apreensão do momento em que ela se da e não num resultado externo, como no observador no caso das experiências científicas. Uma vez que no momento em que a pessoa vive a experiência estética ela apresenta uma acuidade do sensível e vive intensamente os seus sentidos.
A maneira como a experiência se apresente as diferentes pessoas, vai afetar de maneira particular cada uma delas e, consequentemente, a forma de cada uma perceber as coisas. Assim, a aquisição de novas experiências se acumulam na carne sem que a pessoa tenha que se esvaziar dos afetos anteriores. Para cada um, o resultado será distinto.
A consequência disso é que a pessoa se transforma à cada nova experiência, sem que sua aparência biológica, anatômica se modifique. Sendo assim a pessoa se atualiza em constantes transformações plásticas. As transformações da pessoa, em razão dos novos afetos, resulta em novas formas de expressão. Eu quero dizer com isso que, a cada nova experiência, a pessoa se remodela sem perder suas características primárias, mas mesmo assim acrescenta novas sensações à sua carne.
O processo da vida se realiza continuamente, as experiências são incessantemente renovadas, o lugar em que  a pessoa viveu uma experiência se transforma em uma parte constitutiva dela mesma. Desta maneira o novo ser acrescido de suas recentes experiências, age no meio ambiente, já de forma diferente, resultando em novos afetos e dessa forma reinventa sua relação com o mundo.
A pessoa se adapta reintegrando-se num novo ambiente, guardando os afetos do mundo em sua carne ao mesmo tempo que ela alarga os seus limites dentro do mundo. A pessoa possui o mundo e o mundo a possui, ou seja, neste processo, a pessoa adquire novos hábitos a partir dos quais age em seu meio. E com essas constantes trocas, a pessoa tece com o mundo, os seus afetos que lhe aportam novas possibilidades para outras experiências.
Do mesmo modo que a pessoa não pode esvaziar-se das sensações vividas nas experiência cotidianas, ela não pode também esvaziar suas expressões daquilo que ela apreendeu do mundo. Para exprimir-se a pessoa tem sempre como fonte, o conjunto de conhecimentos adquiridos durante a longa troca com o meio ao qual ela se insere. Com isso quero dizer que a pessoa fala um idioma com o sotaque do local que ela aprende a falar, o mesmo acontece com o seu movimento corporal, ele apresenta sotaques do lugar ao qual a pessoa está inserida.
Dewey[12] comenta que a experiência feita pelo artista difere da experiência feita pelo cientista, já que a do primeiro requer uma interação entre objeto e pessoa, pois que o resultado da experiência é a expressão do próprio objeto de arte. No segundo, a expressão do resultado se dá por meio de signos, palavras, símbolos matemáticos, e todas as possibilidades decodificáveis possíveis de uma comunicação narrativa do objeto.
Antes mesmo que o artista comece a desenvolver um projeto, ele traz na carne, no olhar, nos sentidos, os afetos com o meio, suas experiências passadas acrescidas das recentes. Ele os transforma, os recompõe para se reatualizar. No entanto, ele não tem como excluir antigos afetos contidos no seu novo olhar.
Assim, na expressão artística, encontramos coisas que são comuns a todos  e expressadas de forma particular pelo artista. Deveria ser possível perceber os afetos que o artista traz do seu meio, visto que é parte pregnante da pessoa.
Dentre as diversas sociedades, existem diferentes maneiras de apreender o tempo e o espaço. Isto engendra na particularidade do ritmo do movimento corporal, a maneira de mover-se, sentar, andar, gesticular, sorrir, a maneira de ficar de pé, de movimentar os quadris. Há também a particularidade no ritmo de  pronunciar as palavras, mesmo falando o mesmo idioma (veja o português falado no Brasil e em Portugal, o francês de Quebec e da França). Enfim, é o conjunto das atitudes, das ações, dos gestos de cada povo que caracteriza a maneira de trabalhar, se defender, pensar, se expor, como também a expressão corporal.
Na minha pesquisa sobre as diferentes maneiras de mover-se, realizada no Brasil (Brasília), Canadá (Montreal), França (Paris), percebi algumas características marcantes que me chamaram a atenção. Os parisienses correm o tempo todo para se deslocarem nas ruas, para não perder o metrô, ou o ônibus. Paradoxalmente, as ações burocráticas são muito lentas, assim como também a realização de um atendimento no comércio. Lá o comprador tem tempo para retirar o cartão com cuidado, conversar com o caixa, verificar se o que foi cobrado está correto, ajeitar tudo dentro da bolsa e só depois o atendente vai dar atenção ao próximo.
Os Montrealenses são mais lentos no seu deslocamento. Ninguém corre para pegar o metrô ou o ônibus, e mesmo na hora do rush, não há empurrões para entrar no metrô. Pacientemente a fila vai andando e se lotou... Espera o próximo! Talvez essa paciência se dê por causa do longo período invernal: nas ruas, melhor nem tentar correr para não se arriscar a cair e machucar. Em revanche, eles tem o atendimento burocrático rápido e eficiente. No comercio o atendente é rápido também, quando menos se espera já está atendendo o próximo. No Brasil, existe uma certa desordem, no comércio o funcionário atende a pessoa e qualquer outro que chegue para pedir informação, além do que , não exita em conversar ao telefone particular no momento que atende seu cliente. A burocracia é lenta, porém o atendente com sua simpatia costuma resolver o problema; isso se ele estiver de bom humor, o que suponho ser um atendimento passional e não eficaz como deveria ser. Em Brasília, somos habituados aos vastos espaços e à beleza arquitetônica da cidade, às curvas e às retas. Não é habito usar o transporte comum. Cada qual se desloca em seu próprio carro. Resta o transporte público às pessoas que moram no entorno, e sofrem com a desorganização. Com isso concluo que a organização social no Brasil é privada.
Como havia comentado anteriormente, o movimento (ritmo, tempo, direção, espaço), é particular à cada cultura, mas as pessoas tendem a acreditar que isso é inerente ao humano sem considerar as diferenças. Nossos esquemas corporais são fundados na nossa experiência cultural e todo mundo à nossa volta compartilha os mesmos modelos. O caráter passivo dos hábitos, distinguem portanto essa educação exterior de aprendizagem, ativa e engajada na reflexão como nascimento de si ou experiência do mundo.
A pessoa está o tempo todo em relação com estruturas materiais: ambiente geográfico, arquitetural, e também com as estruturas que não são palpáveis: sociais, antropológicas, filosóficas. A cultura afeta a memória, a forma de pensar, as relações humanas, etc... Isso particulariza, os hábitos, a linguagem, a alimentação. São as relações entre essas diferentes estruturas que fecundam a expressividade da pessoa. A casa, o quarteirão, o bairro,  tudo que nos envolve modela o movimento corporal, a forma de expressar suas emoções. Tudo isso é importante para a relação do sensível e da plasticidade da pessoa,  e a relação entre arquitetura e aprendizagem espacial também é muito importante. 
O povo francês se relaciona muito mal com seu próprio corpo. Os sorrisos são discretos, os ombros sempre contraídos, falam muito baixo, sempre preocupados se os outros estão ouvindo, os muculos faciais são frequentemente contraídos, as pernas sempre cerradas uma à outra, é considerado indiscreto olhar diretamente nos olhos de um desconhecido. Não olham jamais diretamente para um estranho mas vigiam e julgam o tempo todo como comenta Foucault[13] . Dessa forma expressam o corpo rígido e deprimido, que para mim nada mais é do que o corpo dócil discutido também pelo mesmo autor.  Uma outra remarca muito importante é o fato da burguesia francesa ser extremamente católica. No entanto a única expressão usada o tempo todo que denuncia a crença é a palavra perdão.
No Brasil, mesmo os que não tem religião utilizam expressões tal como: “Ai meu Deus!”. Ninguém olha com repressão, quando o outro usa uma expressão que remete às crenças cristãs. O povo brasileiro tem o hábito de acreditar que tudo acontece segundo a vontade de Deus. Humaniza o que não pode ser visto pelo o humano, faz do invisível a sua semelhança como discute Jean-Marie Scheffer[14]. O movimento corporal é amplo e ondular, temos constantemente contato com a própria pele. As pessoas usam roupas leves o que contribui para que o limite cutâneo se estenda para a exterioridade.
Os Montrealenses, embora não se toquem como o brasileiro, mantém o seu espaço corporal bem largo. Sentam-se tomando o espaço da cadeira sem se reprimirem. A forma de expressar algo que remete ao cristianismo se dá pelos palavrões, que não são orientados para o sexo, como é para o brasileiro e para o francês. São constituídos por palavras que denominam objetos utilizados em uma missa, como por exemplo, cálice, hóstia, tabernáculo. Inúmeras igrejas em Montreal, foram destruídas por dentro, conservando apenas a forma arquitetônica externa. Dentro deram utilidade aos espaços vazios.
Após discutir sobre os afetos e a plasticidade corporal e comentar que o sotaque do movimento corporal é pregnante na pessoa, eu pergunto: onde se perdem as particularidades dos movimentos corporais de cada povo para que a expressividade em dança contemporânea se apresente padronizada? Onde está a originalidade e por que vemos nas composições coreográficas o modelo do corpo rígido e reprimido do francês?





Referência Bibliográfica:
            
DELEUZE, Gilles. Logique du sens. Paris, les éditions de Minuit, coll. critique, 2005.

DEMEULENAERE, Pierre. Une théorie des sentiments esthétiques, Paris, Grasset, 2001.

DEWEY, John. III L’art comme expérience, introduction par Richard Shusterman, postface de Stewart Buettner, Traduit de l’anglais (USA) dans le cadre du GRAPPHIC et du CICADA par Jean-Pierre Cometti, Christophe Domino, Fabienne Gaspari, Catherine Mari, Nancy Murzilli, Claude Pichevin, Jean Piwnica et Gilles Tiberghien, coordonnée par Jean-Pierre Cometti, publications de l’Université de Pau, Farrago, 2005.

FOUCAULT, Michel. Surveiller et punir, Naissance de la prison, Paris, éditions Gallimard, collection Tel, (1975), (1er dépôt dans la collection : avril 1993), 2006.

KRISTEVA, Julia. Semiotiké, recherches pour une sémanalyse. Paris, edições du Seuil, 1969.

MAINE de BIRAN. De l’aperception immédiate mémoire de Berlin. 1807. Edição organizada por Anne Devarieux, Paris, editora : Le livre de Poche, 2005.

________________. Mémoire sur la décomposition de la pensée, (1804), Paris Librairie philosophique J. Vrin, 2000.

SANTOS, Milton. Território e sociedade, São Paulo, édição Fundação Perseu Abramo, 2000.

SARTRE, Jean-Paul. L’être et le néant, Essai d’ontologie phénoménologique. Edição corrigida por Arlette Elkaïn-Sartre, Paris, collection Tel, Gallimard (1943),1996.

SCHAEFFER, Jean-Marie. In Qu’est-ce q’ un corps ? Afrique de l’Ouest/Europe occidentale/Nouvelle-Guinée/Amazonie sob a direção de Stéphane Breton. Michèle Coquet, Michael Houseman, Anne-Christine Taylor, Eduardo Viveiros de Castro, Paris, Obra co-editada pelo museu do quai Branly e edições Flammarion, 2006.




[1]Sartre, Jean-Paul, L’être et le néant, Essai d’ontologie phénoménologique. Edição corrigida por Arlette Elkaïn-Sartre, Paris, collection Tel, Gallimard (1943),1996.
[2] Maine de Biran, Pierre, De l’aperception immédiate mémoire de Berlin. 1807. Edição organizada por Anne Devarieux, Paris, editora : Le livre de Poche, 2005.
[3] Santos, Milton. Território e sociedade, São Paulo, édição Fundação Perseu Abramo, 2000.
[4] Kristeva, Julia. Semiotiké, recherches pour une sémanalyse. Paris, éd. du Seuil.
[5] Deleuze, Gilles.  Logique du sens. Paris, les éditions de Minuit, coll. critique, 2005.
[6]  Ibid.
[7] Maine de Biran, Mémoire sur la décomposition de la pensée, (1804), Paris Librairie philosophique J. Vrin, 2000.
[8] Ibid.
[9] Dewey, John, III L’art comme expérience, introduction par Richard Shusterman, postface de Stewart Buettner, Traduit de l’anglais (USA) dans le cadre du GRAPPHIC et du CICADA par Jean-Pierre Cometti, Christophe Domino, Fabienne Gaspari, Catherine Mari, Nancy Murzilli, Claude Pichevin, Jean Piwnica et Gilles Tiberghien, coordonnée par Jean-Pierre Cometti, publications de l’Université de Pau, Farrago, 2005.
[10] Chorégraphe québécois.
[11]Dewey, John, 2005.
[12] Dewey, John, 2005.  
[13]Foucault, Michel, Surveiller et punir, Naissance de la prison, Paris, éditions Gallimard, collection Tel, (1975), (1er dépôt dans la collection : avril 1993), 2006.
[14] Schaeffer, Jean-Marie, in Qu’est-ce q’ un corps ? Afrique de l’Ouest/Europe occidentale/Nouvelle-Guinée/Amazonie sob a direção de Stéphane Breton. Michèle Coquet, Michael Houseman, Anne-Christine Taylor, Eduardo Viveiros de Castro, Paris, Obra co-editada pelo museu do quai Branly e edições Flammarion, 2006.


Marcia Almeida
Ph.D em Estética (Filosofia da Arte)/Dança pela Universidade Panthéon Sorbonne Paris 1
Professora  da Licenciatura em Dança do Instituto Federal de Brasília
Coordenadora do grupo de pesquisa em Arte Coreográfica – Dança contemporânea IFB/CNPq

para citação: Almeida,  Marcia. A plasticidade corporal e a dança contemporânea. in III Seminario Nacional de DançaTeatro, Caminhos da dançaTeatro no Brasil. Viçoa, editora TRIBUNA, paginas: 68 a 78 2011. ISBN: 9788572694056 

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